"Go on. Shoot!"

coded by ctellier | tags: , | Posted On sexta-feira, 30 de março de 2012 at 16:36

meteorologia: nublado de novo
pecado da gula: pão na chapa com manteiga
teor alcoolico: nada ainda
audio: nina simone
video: ted talks

The hunger games (Jogos vorazes)
Direção: Gary Ross
Roteiro: Gary Ross, Billy Ray, Suzanne Collins

“Ufa! Tem mais gente que também não achou tão bom assim...”
A expressão de alívio é justificada já que é bastante incômodo ficar duvidando do nosso próprio discernimento. Fui assistir “Hunger games” e, por algum tempo, fiquei com aquela estranha sensação de estar remando contra a maré. Apesar de que quem estava assistindo comigo ter tido percepção semelhante à minha. Afinal, a grande maioria dos meus conhecidos, dos blogs e sites que acompanho estava elogiando o filme. Mas “a maioria” não são todos, e alguns deles corroboravam a minha opinião por motivos semelhantes aos que me incomodaram. Não é que eu tenha detestado, mas certamente eu não o recomendarei - apesar de recomendar o livro (post aqui).

Bom, antes de mais nada gostaria de deixar claro que entendo que o filme é uma adaptação do livro e que, justamente por isso, não tem obrigação alguma de ser totalmente fiel. O que não quer dizer que deixa de ter obrigação de “guiar” o espectador que não leu o livro. Entendo que o filme deva se sustentar per se, sem pressupor qualquer conhecimento prévio dado pela leitura do livro. E um dos principais problemas do filme foi deixar sem explicação vários detalhes que não fazem o menor sentido para quem não leu o livro. Não me recordo de todos, mas aqui vão alguns exemplos:
  • Aquele sinal com os três dedos da mão, qual o significado dele? E por que, depois que Katniss o faz para as câmeras, a população do Distrito 11 inicia um tumulto?
  • O tordo (e o broche de Katniss) aparecem de modo diferente do livro - o que não é um problema - mas fica totalmente “solto” na trama. Afinal qual o significado dele? Qual sua importância?
  • Quem é e qual é exatamente a função da mulher de cabelo cor-de-rosa? A mestre de cerimônias da Colheita, Effie Trinket, não é apresentada, aliás não lembro de o nome dela sequer ser citado.

Outra falha do filme é que “as regras” desse futuro distópico, não apenas as dos Jogos Vorazes, não ficam muito claras. Quem leu o livro sabe que armas são proibidas, que os habitantes dos distritos não podiam sair dos limites da cidade, que era proibido caçar ou obter alimento de alguma outra forma que não fosse no mercado “oficial”. Mas tenho certeza que para quem não leu não é nada simples concluir isso a partir das poucas cenas iniciais que enfocam o dia-a-dia do Distrito 12. E mesmo quanto aos jogos, apesar das poucas explicações dadas pelos apresentadores do reality show, a maioria das regras não fica clara. E não apenas o universo do filme não fica bem esclarecido. Nem o subtexto da narrativa fica bem definido. Vagueia entre a crítica à opressão sofrida pelos moradores dos distritos, à violência de sacrificar 23 adolescentes para sustentar o sistema, passando pela crítica à cultura massificada, viciada em reality shows. É um pouco de tudo e, ao mesmo tempo, parece não firmar-se em nenhuma delas.

Ainda sobre os jogos, além de as regras já existentes não ficarem muito claras há o agravante de que outras são criadas e/ou alteradas ao bel-prazer do idealizador dos jogos, o que também não facilita o entendimento do espectador. Fica claro que é um reality show que segue a premissa Highlander: “Só pode haver um”. São pessoas se matando em frente às câmeras, matando para não serem mortas. Sendo assim, presume-se que haja violência, muita violência. No livro há. Mas no filme, pouco ou nada se vê do motivo dos jogos serem chamados de “vorazes”. As cenas de ação chegam a ser tão sonolentas quanto o restante do filme (sim, eu achei o filme arrastado). Parece faltar coragem para mostrar a violência, que tem de sobra no livro.


Algo que eu achei que também se perdeu na transposição do livro para o roteiro foi a complexidade dos personagens. Todos parecem rasos e sem motivação. Não há empolgação em qualquer atitude. Mesmo os atos de rebeldia não parecem rebeldes justamente por não terem sido explicitadas suas razões. Não posso culpar o elenco, já que provavelmente o roteiro não conseguiu dar a profundidade necessária aos personagens. O romancezinho do casal de tributos parece ainda mais insosso do que é na verdade. O ataque de choro de Katniss mais parece o de uma criança birrenta. E o discurso de Cato durante a luta final, de onde veio? Qual a motivação dele, já que inteligência não parece ser sua melhor característica?

Sendo o livro narrado em primeira pessoa por Katniss, o leitor acompanha tudo pelo seu ponto de vista, sabendo de suas opiniões, suas angústias, seus medos. E isso tudo foi perdido no filme. Boa parte do interesse gerado na leitura são seus conflitos:
  • ter de matar pra sobreviver - matar outras pessoas- , dilema que, exceto pelos carreiristas, aflige também aos demais concorrentes;
  • render-se ou não ao joguete político para conseguir apoio;
  • o caráter de Peeta - ela oscila constantemente entre acreditar que o sentimento dele é sincero e que é apenas um ardil para conquistar a audiência.
E nada disso foi explorado. Admito que colocar o fluxo de pensamento de um personagem num filme não é tarefa das mais fáceis, mas há várias maneiras de expôr suas dúvidas e inquietações sem ter de apelar para uma narração em off. A atriz (Jennifer Lawrence) é boa, mas a personagem é apática demais para gerar qualquer empatia.

Bem, para quem resolver assistir fica o aviso: os que não leram o livro com certeza ficarão se perguntando sobre detalhes não explicados; e os que leram certamente sentirão falta da narrativa envolvente e dos personagens cativantes do livro.

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Risque e rabisque

coded by ctellier | tags: , | Posted On quarta-feira, 28 de março de 2012 at 14:21

meteorologia: chovendo
pecado da gula: bolo de abacaxi
teor alcoolico: nada ainda
audio: afrocelts
video: hook

Há certos dias em que um assunto insiste em retornar à superfície do pensamento, por mais que se tente deixá-lo de lado. Talvez, justamente por tentar colocá-lo para escanteio, ele teime em voltar à baila. E não houve jeito, entreguei os pontos, rendi-me à sua insistência percebendo que só teria sossego quando expusesse minha opinião. (E ainda há gente que duvide que blogueiros são seres malucos por natureza).

Bom, antes de mais nada, o gatilho. Sou o tipo de internauta (a palavra é feia, mas não há outra denominação melhor) que tem o hábito de vaguear a esmo de um site a outro - menos do que gostaria e mais do que deveria. Diversão que por muitas vezes me levou a descobrir tanto sites muito interessantes quanto outros bem dispensáveis. No último final de semana, um clique me levou a um site - não vale a pena mencionar qual - e detive-me nele para ler alguns posts. Parei logo no primeiro, impossibilitada de continuar pela extrema má qualidade do texto. Conseguem imaginar um texto em que há dois ou mais erros em cada parágrafo? Alguns nitidamente refletiam pressa na digitação, mas outros... prefiro nem citar. Sinto náuseas só de lembrar - drama mode ON.

Comentei minha indignação e irritação com meu leitor/ouvidor de plantão. “Ah, mas são erros perdoáveis”, disse ele. E eu discordei, e continuo discordando. Eu escrevo e sei que erros acontecem, por mais cuidadosos que sejamos. Um ou outro erro perdido no texto é aceitável. Afinal, ninguém é prefeito - ops! perfeito. Mas uma sucessão deles não é falta de atenção ou pressa de escrever, é pura negligência.

Bem, deixei o assunto de lado, acreditando que de um dia para outro ele se esgotaria por si só. Lêdo engano. Dois textos lidos ontem, reavivaram o tema em minha mente. Primeiro, um post do Pablo Villaça no Diário de Bordo com pouca, ou nenhuma relação direta com o assunto - Prisioneiro de quem sou. Depois, um texto no Livros e afins que tinha tudo a ver com a minha indignação com aquele outro texto crivado de erros - Textos são cartões de visita. Pensei, por um momento, que tudo o que eu queria dizer sobre o assunto estava ali, mas não. Ainda faltava eu relacionar as ideias contidas nos dois textos. Um dos parágrafos no post do Villaça chamou-me a atenção, em especial, uma frase: “Tenho orgulho de meu intelecto, de minha cultura e do que escrevo”. Também me sinto assim, e não há como me orgulhar do que escrevo se não o fizer bem feito. O que me leva ao outro texto, pois o que eu escrevo me representa perante quem me lê: “(...) um texto que tem a nossa assinatura nos representa”.

Sei que o importante é conseguir comunicar as ideias, mas um texto repleto de erros certamente terá o efeito de afastar o leitor ao invés de aproximá-lo de quem o escreveu. Erros são aceitáveis... até certo ponto. Aliás, há inclusive os propositais, que servem ao contexto do que está sendo escrito. Porém, entendo que há uma linha em que o erro deixa de ser descuido, falta de atenção para se tornar desleixo. Dá a impressão de que quem escreveu foi totalmente negligente e nem se deu ao trabalho de reler antes de tornar público. Atitude que, no meu entender, demonstra um grande desrespeito com o público leitor. Fico pensando, ao ler um texto assim: “Se quem o escreveu sequer revisou, talvez signifique que não faz questão de ser lido, ou que pouco importa quem leia, ou que pouco importa a opinião de quem lê. Então, para que lê-lo?”.

Onde se escreve, ou melhor, em que situação o texto será lido faz diferença. Num bate-papo num chat, num email informal, naturalmente a tolerância é maior. Em um texto que será publicado e lido por várias pessoas, num email formal, nem tanto. Admito, sou maníaca no que diz respeito ao que escrevo. Sim, eu fico aflita ao escrever distraidamente algo incorreto - que é prontamente corrigido logo que o percebo. Mas, mesmo que não fosse assim, por respeito ao leitor e também, logicamente, para meu respaldo, eu faria a revisão antes de publicar o que quer que seja. Afinal, além de ser meu cartão de visitas, ninguém é obrigado a ler um texto “mau” escrito.

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Drops » Precious

coded by ctellier | tags: , , | Posted On domingo, 25 de março de 2012 at 09:18

meteorologia: nublado
pecado da gula: croissants no café-da'manhã
teor alcoolico: nada ainda
audio: into the wild ost
video: videocast pipoca e nanquim

Precious (Preciosa)
Direção: Lee Daniels
Roteiro: Geoffrey Fletcher


Baseado no livro "Push", de Sapphire, que já comentei num post anterior. Como escrevi nesse post, ainda não assistira ao filme. Até tinha baixado via torrent, mas entre tantas outras coisas para assistir, acabava ficando para depois. Ontem, aproveitei que estava passando no TC Touch e remediei essa falta.

São mídias diferentes e, logicamente, é humanamente impossível transpôr do papel para a película, todo o impacto do livro. Mas mesmo assim, o filme consegue ser bastante fiel ao espírito da narrativa. Perde-se um pouco no filme o quanto a evolução, a transição, a transformação de Precious deve-se ao seu aprendizado, ao seu contato cada vez mais íntimo com a leitura e a escrita.

Se há algo que transparece - tanto no livro quanto no filme - é que a esperança em algo melhor é o que move a personagem. Apesar de ser uma pária em todos os locais que frequenta - desde a escola comum até sua própria casa - a esperança de conseguir se tornar uma pessoa melhor, capaz de criar seus filhos, é a tábua de salvação de Preciosa.

O filme é tão, ou mais, chocante que o livro. Ver na tela a humilhação, a violência - verbal e física - a que a personagem é submetida é um lembrete amargo de que aquilo é real. E de que há mulheres que vivem essa realidade, nem sempre conseguindo sobreviver a ela.

A atuação de Gabourey Sidibe, como Precious, impressiona. Percebe-se nela, ao mesmo tempo, o "recolhimento" e a força reprimida da personagem.

Enfim, pra quem leu e pra quem ainda não leu o livro, é um filme que vale a pena ser visto.


"Toda folha de grama tem seu Anjo que se curva sobre ela e sussurra: 'Cresce, cresce'"
(Talmude)

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