Los amantes pasajeros

coded by ctellier | tags: | Posted On terça-feira, 19 de novembro de 2013 at 17:09

meteorologia: chuva de verão
pecado da gula: pão de queijo
teor alcoolico: nada ainda
audio: ghost writer podcast #33
video: wallander

Los amantes pasajeros (2013) - Os amantes passageiros
roteiro e direção: Pedro Almodóvar
★ ★ ★ ★ ★

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 03/10/2013)

Dentro de um avião fora de controle, um grupo de personagens excêntricos acredita estar vivendo suas últimas horas de vida. A partir dessa premissa, o espectador testemunha a volta de Almodóvar ao tipo de filme que o consagrou: a comédia. Desde Kika (1993) que o diretor havia deixado de lado esse estilo. E retorna a ele da forma mais escrachada possível. Mas, afinal, é Almodóvar, e de que outro modo ele o faria?

Para o espectador saudoso dos primeiros filmes do diretor, com seus cenários de cores fortes, personagens extremos em situações extremas, figurinos extravagantes, diálogos disparados em velocidades alucinantes, está tudo de volta. E isso talvez dê a impressão de que o diretor está referenciando ou mesmo parodiando a si próprio. É difícil não relembrar de Mulheres à beira de um ataque de nervos que, assim como este, passa-se praticamente em um único cenário - um apartamento - e há uma personagem que deixa de ser virgem durante a estória. Além disso, há várias cenas marcantes - chocantes ou engraçadas- envolvendo drogas, sexo ou ambos.

O rol de personagens, uma fauna bastante diversificada, inclui três comissários de bordo homossexuais - um que bebe, Joserra (Javier Cámara), um que consome drogas ilícitas, Ulloa (Raúl Arévalo) e um que abraçou a religião para se livrar dos vícios, Fajas (Carlos Areces); um piloto bissexual, Álex Acero (Antonio de la Torre), cujo amante é Joserra; um co-piloto “saindo do armário”, Benito Morón (Hugo Silva), por quem Ulloa tem uma queda; uma vidente, a virgem que deixa de ser, Bruna (Lola Dueñas); uma cafetina de luxo, Norma (Cecilia Roth); um empresário corrupto; um ator, Ricardo Galán (Guillermo Toledo); um agente de segurança; um casal em viagem de núpcias. Os personagens são estereotipados? Ao extremo, são quase caricaturas. Seus trejeitos e neuras são exagerados? Sem dúvida. Mas boa parte do humor e da crítica ácida deve-se justamente a esses fatores.

Enquanto o roteiro se atém às ações e reações dos personagens dentro do avião, a trama se sustenta. Contudo perde força ao sair do ambiente confinado e mostrar uma subtrama, em que uma moça andando de bicicleta atende um telefonema do ex-namorado (o ator) num celular que “caiu do céu”, ou mais precisamente, das mãos de uma suicida que também conhece Galán. Apesar de interessante, principalmente aos que têm sua atenção atraída pela beleza da moça, Ruth (Blanca Suárez), a sequência não é muito relevante, e poderia ser encurtada ou mesmo suprimida sem qualquer prejuízo.

O título em inglês, I’m so excited, é o nome de uma música utilizada como trilha sonora para um numero de dança protagonizado pelos comissários a fim de entreter os passageiros - apenas os da primeira classe, pois os da classe econômica estão dormindo, pois foram dopados assim que a tripulação descobriu a pane. A partir daí pode-se ter uma ideia nítida do quão non-sense, exagerado e, ao mesmo tempo, sarcástico é o filme. Esse tom exagerado se vale ainda das cores fortes do cenário e da fotografia, com enquadramentos que lembram programas de tv - principalmente na hora do “show”.

Não se pode afirmar com veemência que Almodóvar tenha perdido a mão. É possível que sua intenção fosse mesmo fazer uma paródia de suas melhores comédias. De qualquer modo, não deixa de ser um filme menor. Mas, levando-se em conta que Almodóvar é um autor - em oposição ao conceito de artesão, ou diretor por encomenda -, vale a máxima defendida por Truffaut na revista Cahiers de Cinéma: “Um cineasta que tenha feito grandes filmes no passado pode cometer erros, mas os erros que ele cometer têm toda a probabilidade, a priori, de ser mais apaixonantes que os êxitos de um ‘artesão’”.



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Mary and Max

coded by ctellier | tags: | Posted On quarta-feira, 13 de novembro de 2013 at 11:57

meteorologia: finalmente, o verão
pecado da gula: banana com nata
teor alcoolico: nada ainda
audio: beatles
video: black mirror

Mary and Max (2009) - Mary e Max - Uma amizade diferente
roteiro e direção: Adam Elliot
★ ★ ★ ★

Correndo o risco de entregar a idade, admito fazer parte da geração privilegiada que curtiu infância e adolescência nos anos 80. Nessa época pré-internet, sem email, twitter ou facebook, a troca de cartas foi durante um bom tempo a única maneira (não muito cara) de se comunicar com pessoas de outros países. E é a partir dessa premissa que se inicia a estória de Mary and Max.

Mary Daisy Dinkle é uma menina de 8 anos que mora na Austrália, em Monte Waverley, nos arredores de Melbourne. Solitária, meio gordinha, com uma pequena mancha marrom no rosto, sofre bullying na escola. Instigada por uma dúvida pungente, inicia uma troca de cartas com Max Jerry Horowitz, um judeu de 44 anos, morador de Nova York. Obeso e portador de Síndrome de Asperger - uma variante do autismo, também conhecida como autismo de alta funcionalidade - é, ao mesmo tempo, semelhante e oposto a Mary. Ambos sentem-se deslocados no ambiente em que vivem, que lhes parece estranho e, por vezes, inescrutável. Contudo enquanto Mary é curiosa e quer entender o mundo, Max contenta-se em manter-se recluso com medo de explorá-lo.

Fiquei bastante interessada em assistir tanto pela temática - eu mesma tive alguns penpals, amigos por correspondência, durante anos - quanto por se tratar de uma animação em stop motion - o que eu adoro. É o primeiro longa do diretor/roteirista, que já havia mostrado a que veio ao ganhar o Oscar de Melhor Curta de Animação, em 2004, com Harvie Krumpet - entre outras 20 premiações. Conforme informação do próprio Elliot, Mary and Max foi baseado em fatos reais, usando sua própria experiência e a de um penpal com que se correspondeu durante anos.

Os bonecos parecem ter sido propositalmente “mal modelados”, com formas bem simples, quase caricatas. Como uma indireta para o espectador: “a aparência não importa, o que importa é a essência”. Em contrapartida, os cenários se destacam tanto pela riqueza de detalhes quanto pelas cores utilizadas nos ambientes de cada personagem. Enquanto vemos Mary em cenários em tons de sépia, variando do bege ao marrom, o mundo de Max é dessaturado, totalmente em preto, cinza e branco. E, em ambos, objetos “especiais” aparecem em vermelho.

Diferente de várias animações, não se reconhecem trejeitos dos dubladores nos bonecos de massinha. Mary é dublada, quando criança, por Bethany Whitmore, e, quando adulta, por Toni Collete. Enquanto Max ganha a voz, praticamente irreconhecível, de Philip Seymour-Hoffman. E não são apenas os personagens principais que dão vida à narrativa. Os personagens secundários - a mãe de Mary e o vizinho da casa em frente, a vizinha de Max e seu médico - são muito bem cuidados e contribuem com o desenvolvimento da trama, sem nenhuma ponta solta ou situação desnecessária.

Apesar das diferenças, são as semelhanças que aproximam Mary e Max. O gosto por chocolate - a comida predileta de Max é uma receita de cachorro-quente de chocolate inventada por ele -, um programa de tv a que ambos assistem - Os Noblets, e principalmente a dificuldade de ambos em compreender como o mundo funciona e por que as pessoas tomam certas atitudes. Um bom exemplo das dúvidas que assolam as mentes dos personagens é a pergunta que levou Mary a escrever para Max: de onde vêm os bebês? São questões básicas, que qualquer criança na idade dela - ou na condição de Max - já deve ter tido curiosidade em saber. Mas o interessante não são apenas as perguntas. As teorias, ou conhecimentos prévios de cada um deles, refletem (enquanto criticam) o pensamento distorcido e as crenças de suas famílias.

No caso dos bebês, enquanto Mary diz que, na Austrália, são achados em copos de cerveja, Max afirma que, nos EUA, eles vêm de ovos chocados por rabinos ou freiras - dependendo da religião - e, na ausência destes, por prostitutas sujas e solitárias.
A partir daí já se apreende o tom do filme. Um humor ácido e, por vezes, politicamente incorreto que permeia os assuntos conversados nas cartas ou abordados no cotidiano de cada um. Indo dos mais casuais aos mais “cabeludos”, passando por bullying, distúrbios mentais, programas de tv, alcoolismo, cleptomania, religião, agorafobia, comida, diversidade sexual, preconceito, depressão, entre outros. Mas apesar dos temas pesados e difíceis, o que sobressai é a amizade entre eles que sobrevive durante tantos anos.

É um filme “de massinha” e cheio de humor? Sem dúvida. Porém, com certeza absoluta não é um filme para crianças. Não por serem temas sobre os quais elas não devem ouvir a respeito, mas essencialmente por ser necessária uma bagagem referencial grande para desfrutar do humor e das citações.





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Review » Skechers Go Bionic

coded by ctellier | tags: , | Posted On terça-feira, 24 de setembro de 2013 at 20:07

meteorologia: chega de chuva!!
pecado da gula: batata sauté
teor alcoolico: nada ainda
audio: carmina burana
video: american horror story

Todo corredor, ao perceber que a vida útil de um dos seus (vários) pares de tênis estão perto do fim, começa a pensar no próximo a ser usado. Foi-se o tempo em que eu era fiel a apenas uma marca/modelo, adepta da máxima “Em time que está vencendo, não se mexe.”. Nos últimos anos, principalmente depois de aderir à corrida minimalista, sempre estou experimentando novos modelos desse estilo, já que percebi que o importante mesmo é a mecânica da passada, mais que o próprio calçado.

Sendo assim, quando chegou o momento de aposentar meu Brooks Ghost, depois de alguma pesquisa, optei pelo Skechers Go Bionic. Foi o escolhido, entre outros motivos, pois já o tinha visto “pessoalmente” - no workshop de corrida natural ministrado pelo Sérgio Rocha - e constatado o quanto era leve e flexível. Além disso, munida de um cupom de desconto de uma loja online, o preço estava dentro do que acho o máximo aceitável - ainda que não exatamente adequado - pagar num tênis: R$ 299,00 (já com o desconto de R$ 50,00).



Um parênteses aqui: além da vantagem evidente na corrida em si, passar a praticar corrida natural/minimalista traz também uma vantagem econômica, já que o preço dos tênis cai praticamente pela metade - para quem costuma comprar os “da moda”, que custam entre R$ 600,00 e R$ 700,00. Nem levo em conta o Wave Prophecy que é, no meu entender, um ponto fora da curva que deveria ser boicotado pelos consumidores devido ao preço abusivo. Convenhamos, pagar 900 reais num tênis é quase como queimar dinheiro :-P

Bom, já comentei sobre um dos aspectos do tênis: o preço. Não é dos mais baratos, mas cabe no orçamento, considerando que provavelmente irei substituí-lo apenas daqui a um ano. Vamos aos demais.

Confesso que ao receber a embalagem das mãos do carteiro, duvidei que fosse mesmo o tênis. Leve demais. Mesmo. Muito mais leve que as embalagens com livros que costumam ser entregues aqui em casa. Abri logo a caixa e o tênis estava lá. Ufa! Não cheguei ao cúmulo de colocá-los na balança, mas conforme o Corrida Natural, o tamanho 42 pesa 169g. Ou seja, o meu - tamanho 38 - deve pesar um pouco menos. Para facilitar a “visualização”, imagine 8 fatias de mussarela de espessura média. Imaginou? É o que pesa o tênis.

Por causa da forma larga e do peso reduzido, a sensação ao calçá-lo é a mesma de vestir uma meia grossa. E mesmo andando, essa sensação persiste. Vantagem sobre o Five Fingers que, por mais confortável que seja, gera um certo estranhamento por conta dos dedos separados. O pé fica esparramado, sem “pegar” em nenhuma costura. Ao menos com meias. Sem elas, eu não testei ainda.

A espessura da sola é de 11mm, ou seja, amortecimento quase nulo - apesar de não parecer. Mas para quem está acostumado a correr descalço, de huaraches ou de Five Fingers não há qualquer desconforto. Para quem optar pelo Go Bionic como seu primeiro tênis minimalista, vale lembrar da fase de adaptação que não deve ser desconsiderada na transição de tênis mais estruturados para modelos como este.

Somando-se essas características, mais o drop zero, pode-se afirmar que é um modelo minimalista. É uma ótima opção para quem quer ter a mesma sensação experimentada ao usar um Five Fingers mas sem pagar o mico de parecer estar usando “pés de hobbit” (apelido carinhoso que meu namorado deu ao meu KSO).

Testei-o tanto na esteira quanto na rua (treino e prova), tanto em tiros quanto em longos e não tenho qualquer reclamação. Li alguns reviews reclamando das palmilhas que se deslocam. Comigo não aconteceu. Troquei o cadarço original apenas por comodidade - não gosto de ficar amarrando/desamarrando os tênis - mas o original não apresentou qualquer inconveniente. Enfim, fiquei super satisfeita com a aquisição.

O vídeo abaixo foi o melhor que encontrei para demonstrar o quanto o modelo é flexível, justificando a sensação de extremo conforto ao correr com ele:



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The conjuring

coded by ctellier | tags: | Posted On sábado, 21 de setembro de 2013 at 19:00

meteorologia: sol, calor e muito, muito vento
pecado da gula: bolo de coco
teor alcoolico: nada ainda
audio: matchbox 20
video: american horror story

The conjuring (2013) - Invocação do mal
roteiro: Chad Hayes, Carey Hayes
direção: James Wan
★ ★ ★ ★ ★

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 13/09/2013)

Antes de existir Amityville, existiu Harrisville. Baseado em uma história real, Invocação do Mal conta o terrível episódio de como os investigadores paranormais mundialmente renomados Ed e Lorraine Warren foram chamados para ajudar uma família aterrorizada por uma presença obscura em uma fazenda isolada. Forçados a confrontar uma poderosa entidade demoníaca, os Warrens viram-se presos no caso mais terrível de suas vidas.
(fonte: http://wwws.br.warnerbros.com/theconjuring)

Muitos roteiros valem-se do recurso de afirmar que a trama é “baseada em fatos reais” para dar mais peso à história. Neste caso, não é apenas um recurso narrativo. Essa tática já é tão manjada e utilizada tão sem critério que confesso ter duvidado dessa premissa e “googlei” o nome dos personagens depois de assistir ao filme. Ed e Lorraine Warren realmente existiram, foram demonologistas amplamente conhecidos e reconhecidos, e o roteiro baseia-se nos arquivos dos casos investigados pelo casal.

O roteiro não prima pela originalidade, afinal não há muita margem para a criatividade ao escrever sobre uma casa mal-assombrada. Não há como escapar de sussurros e ruídos estranhos, portas e janelas se abrindo, ou se fechando, aparentemente sozinhas, pancadas no chão e paredes, quadros e objetos decorativos sendo jogados ao chão. Mas mesmo assim é bastante eficiente ao focar-se mais na tensão causada pela existência da “assombração” do que nos sustos em si.

O prólogo - quase uma pegadinha para quem não faz ideia do que se trata o filme - funciona muito bem ao apresentar o casal de investigadores e seu modus operandi. Há, embutida nele, a dica de que o filme não se resumirá a sustos e gritos histéricos, como boa parte dos filmes de terror infelizmente costuma ser.

A estória se passa no início dos anos 70 e vale a pena reparar na reconstituição de época que não deixa a desejar. Desde os carros, até as roupas - as estampas de vestidos e camisolas, os cortes dos ternos e camisas - passando pelos penteados - o que são aquelas costeletas? rs - e elementos do cenário - mobília e eletrodomésticos. Sem contar a trilha sonora, quase toda diegética, com ótimos hits da época.

O elenco está muito bem, com destaque para Vera Farmiga (Lorraine Warren), lógico. Um rápido flashback sobre um caso investigado que “desandou” talvez explique sua constante melancolia, mas mesmo asssim. Sua cara de tristeza durante todo o filme às vezes parecer meio forçada. Patrick Wilson (Ed Warren) não desaponta. Lily Taylor (Carolyn Perron), quase no mesmo clima de Hemlock grove, consegue nos fazer esquecer do péssimo The haunting A casa mal assombrada. Ron Livingston, o eterno Tenente Lewis Nixon em Band of Brothers, consegue ser bem convincente como o único homem numa família de seis mulheres.

Não sei se é realmente o melhor filme de terror dos últimos tempos. Mas certamente James Wan - responsável por Saw (o primeiro, de 2004), pelo razoável Death Sentence (2007) e pelo recente Insidious (2011) - conseguiu fazer um filme de terror acima da média, competente e com várias referências para os fãs do gênero.



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Premium Rush

coded by ctellier | tags: | Posted On sábado, 14 de setembro de 2013 at 15:25

meteorologia: verão, cadê você?
pecado da gula: cocada
teor alcoolico: nada ainda
audio: beethoven
video: breaking bad

Premium Rush (2012) - Perigo por Encomenda
roteiro: David Koepp, John Kamps
direção: David Koepp
★ ★ ★ ★ ★

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 03/09/2013)

Todo motorista que circula pelas ruas de São Paulo já está habituado aos motoboys. E quando digo habituado, refiro-me à presença deles e não às suas estrepolias no trânsito, geralmente súbitas e inseguras. Imagine se essa horda de “cachorros loucos” fosse formada por couriers pilotando bicicletas ao invés de motos. Conseguiu imaginar? Se sim, você acaba de visualizar Nova Iorque. Agora imagine que alguns desses “ciclistas” estejam correndo contra o tempo, não para fazer a entrega no menor tempo possível, mas para resolver um problema causado pelo conteúdo de uma das entregas. Imaginou? Então você acaba de vislumbrar o roteiro de “Perigo por Encomenda”.

Wilee (Joseph Gordon-Levitt) é um quase advogado (falta fazer o exame final, similar à da OAB) que trabalha como entregador-ciclista, ou bike messenger, suprindo sua demanda por adrenalina pedalando ferozmente pelas ruas de Nova Iorque. Na gíria dos ciclistas, ele é um fixeiro, ou seja, usa uma bicicleta sem marchas, sem roda livre (os pedais se movem o tempo todo junto com as rodas) e sem freios - já que os próprios pedais podem ser utilizados para frenagem. Ele é o que se poderia chamar de adepto do ciclismo “de raiz”.

Bobby Monday (Michael Shannon, o General Zod de “Homem de aço”) é um policial viciado em jogo que quer o conteúdo de um envelope que deve ser entregue por Wilee. Vanessa (Dania Ramirez) é a ex-namorada, também entregadora, que desaprova o modus operandi de Wilee. Manny (Wolé Parks) é outro bike messenger da mesma empresa, que cobiça Vanessa e inveja Wilee.

Gordon-Levitt literalmente deu o sangue pelo papel, sua atuação é intensa o bastante para convencer o espectador de que ele realmente consegue pedalar daquela maneira. Contudo, o filme basicamente se resume a perseguições frenéticas pelas ruas de Nova Iorque enquanto Bobby tenta impedir que o tal envelope chegue a seu destino, com direito a um alívio cômico proporcionado por um policial nova-iorquino, também ciclista. Alguns flashbacks intercalados explicam como cada personagem chegou à situação atual. Inserções no estilo Google Maps and Navigation ilustram as rotas a serem seguidas pelos messengers. E o próprio Wilee tem ‘previews’ dos caminhos possíveis a seguir quando um obstáculo se apresenta.

E é apenas isso. Um filme de perseguição, rápido, não cansativo, interessante de assistir num sábado de ócio no sofá com pipoca. Diverte sem ser tolo, apesar de algumas situações improváveis. Mas também não leva a qualquer reflexão pós-filme. Puro entretenimento.



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2 Guns

coded by ctellier | tags: | Posted On terça-feira, 10 de setembro de 2013 at 15:10

meteorologia: sol e céu azul
pecado da gula: pão de queijo
teor alcoolico: nada ainda
audio: tiesto
video: the bone collector

2 Guns (2013) - Dose dupla
roteiro: Blake Masters
direção: Baltasar Kormákur
★ ★ ★ ★ ★

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 27/08/2013)

O filme é uma adaptação da série de quadrinhos homônima publicada em 2007 pelo Boom! Studios. Escrita por Steve Grant e ilustrada pelo brasileiro Mateus Santolouco, a HQ conta a história de um agente do departamento de narcóticos (DEA), Robert 'Bobby' Trench (vivido no filme por Denzel Washington), e de um oficial da inteligência naval, Michael 'Stig' Stigman (no filme, Mark Wahlberg), que investigam um ao outro sem saber de suas reais identidades. No filme, trabalham juntos tentando se infiltrar um cartel, mas algo dá errado e ambos acabam perseguidos por seus próprios empregadores.

É um típico buddy movie, mas com algumas particularidades que incrementam a narrativa. A fórmula “dupla combatendo o crime”, apesar de bastante batida, funciona bem aqui. Isso se deve principalmente ao detalhe de que cada um deles não sabe da verdadeira identidade do outro, ao menos no início da trama. Trabalhando para agências diferentes, acham que o parceiro é um traficante de verdade, o que resulta em situações bem divertidas. Depois de descobrirem que ambos estão do mesmo lado da lei, a “graça” persiste ao se tornarem uma versão século XXI de Murtaugh e Riggs, discutindo o tempo todo feito um casal ranzinza.

É uma pena que a estrutura “dupla age baseada em fatos que se revelam falsos / dupla se ferra / dupla se safa” repita-se tantas vezes durante todo o filme, a ponto de se tornar cansativa. Na segunda metade do filme, o espectador já assiste às cenas aguardando o momento em que o roteirista “puxa o tapete” dos protagonistas para ver como eles conseguirão escapar.

Não fosse o carisma da dupla central e a ótima dinâmica entre os personagens, o filme seria um daqueles em que o espectador começa a checar o relógio passados apenas 40 minutos de projeção. O pavio curto de Stig, assim como a aparente carência de uma inteligência mais aguda, fazem o contraponto ideial para a malemolência de Bobby e seu distanciamento de relações sociais.

Usando uma paleta de cores “estouradas”, a fotografia deixa o espectador o tempo todo com a mesma sensação de desconforto causada pelo calor e pela aridez do deserto mexicano. Trilha sonora bacana - composta pelo responsável pela trilha do ótimo “Distrito 9”, Clinton Shorter - complementa bem tanto as cenas de ação quanto as (poucas) cenas mais calmas. Não é daquelas que se sai cantarolando do cinema, mas é boa o suficiente para não ser notada quando não é necessário.

Filme de ação quase ininterrupta, diverte sem ofender (muito) a inteligência do espectador. Basta relevar alguns exageros e non-senses da trama - comuns a esse estilo de filme - e a diversão está garantida, com direito a muita pipoca.

“Never rob a bank that’s across the street from a diner with the best doughnuts in three counties"



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Jobs... Steve Jobs

coded by ctellier | tags: , | Posted On sábado, 7 de setembro de 2013 at 14:57

meteorologia: solzinho simpático
pecado da gula: bolo de coco
teor alcoolico: nada ainda
audio: brainscast #79
video: les revenants

Jobs (2013)
roteiro: Matt Whiteley
direção: Joshua Michael Stern
★ ★ ★ ★ ★

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 23/08/2013)

O filme enfoca a vida do sócio-fundador da Apple, desde sua juventude hippie, passando pela fundação da empresa que lhe garantiu a fama de inovador até sua volta à empresa como CEO, depois de ter sido relegado durante alguns anos.

Mesmo não conhecendo a fundo os eventos e nem tendo lido a biografia de Steve Jobs, percebe-se que parte das críticas feitas ao filme por Steve Wozniak (fundador da Apple junto com Jobs) procedem. Nota-se que é dada muita ênfase à figura de Jobs, às suas decisões, às suas ideias e ao seu modo de conduzir os negócios. Os demais “personagens’, apesar de provavelmente terem participado bem mais ativamente dos acontecimentos, ficam relegados quase a meros coadjuvantes. Não que Jobs não tenha seu mérito, isso é inquestionável. Mas o roteiro exagera ao tentar induzir o espectador a achar que Jobs foi o principal - senão, único - responsável para a Apple ser o que é. Steve Jobs vai de ‘underdog’ a gênio inovador quase num piscar de olhos. Sim, é clichê. Assim como é extremamente clichê a cena em que ele tem sua epifania sobre o futuro a seguir.

O filme tem um problema de ritmo. Apesar da duração ser de pouco mais de duas horas, tem-se a impressão de que se arrasta por muito mais tempo. Mesmo que aparentemente alguns eventos tenham sido “acelerados” a fim de caberem no tempo da narrativa - o que por vezes compromete o entendimento - a fluxo narrativo parece truncado, sem fluidez. Inevitavelmente, tentar condensar cerca de 25 anos num roteiro de duas horas incorreria em problemas dessa natureza. Há ainda falhas no roteiro que atrapalham a boa compreensão da estória. Em vários momentos, Jobs tem certas atitudes cujas motivações não ficam claras e o espectador fica com a impressão de ter cochilado por alguns minutos e perdido algo importante (talvez isso aconteça eventualmente).

Contudo, discordo de Wozniak quanto à responsabilidade de Ashton Kutcher nessa visão de Jobs. O ator apenas interpretou o que estava no roteiro. Kutcher, aliás, apesar de bastante inspirado em alguns momentos - a ponto de fazer o espectador “ver” Jobs na tela - em outros, pende para a caricatura de um modo que chega a incomodar. É necessário ressaltar o excelente trabalho de Mary Vernieu na seleção do elenco. O “garimpo” deu um ótimo resultado, pois os atores escolhidos se assemelham bastante a seus correspondentes reais.

Ainda sobre semelhança, a cenografia e o figurino remetem o público diretamente aos anos 70, logo no início. A reconstrução de época é muito eficiente e mesmo o efeito “foto antiga” do filme não chega a incomodar demais. Para completar a imersão, destaque para a trilha sonora bastante emblemática. A fotografia também é boa, favorecendo ângulos que deixem Kutcher ainda mais parecido com Jobs.

Para um filme que tem a missão de contar a trajetória de alguém resposável por uma revolução no modo como as pessoas encaravam a informática e os computadores, ele passa longe de qualquer conceito inovador, beirando a mediocridade. Não há dúvidas de que se o filme fosse um produto da Apple, após o preview Jobs enviaria o projeto de volta para a prancheta.



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The Bling Ring

coded by ctellier | tags: | Posted On segunda-feira, 5 de agosto de 2013 at 18:07

meteorologia: friozinho chato (de novo)
pecado da gula: bem-casados
teor alcoolico: nada ainda
audio: the doors
video: o ano em que meus pais sairam de férias

(resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 28/07/2013)

The Bling Ring (2013) - The Bling Ring: A Gangue de Hollywood
roteiro e direção: Sofia Coppola
★ ★ ★ ★ ★

O artigo em que se baseia o roteiro - The Suspects Wore Louboutins - foi publicado na Vanity Fair, um misto de Caras e Marie Claire, ou seja, o tipo de revista que não tenho hábito (nem vontade) de ler, nem em salas de espera. Aliás, antes de assistir ao filme, eu nem sabia que Louboutin é uma marca, ou melhor, uma grife de sapatos - meu conhecimento desse assunto resume-se aos Manolo Blahnik usados pela Carrie de Sex and the city.

Resumindo, não conheço (praticamente) nada do universo retratado no filme. O que não me impediu de desfrutar de todo o resto. Certamente, quem conhece grifes, marcas e celebridades terá um divertimento a mais. Porém, o flime sustenta-se bem sem esse conhecimento prévio.

Não foi difícil comprar a ideia de um bando de patricinhas entediadas não achasse nada de mais invadir casas de celebridades para roubar. Até mesmo o fato de o endereço dos famosos se encontrar a apenas um clique no Google é aceitável. Se há algo que foi difícil acreditar é que essas mesmas celebridades - ao menos algumas delas - , ao sairem em viagem, deixassem suas casas, enormes por sinal, abandonadas, sem sequer um empregado e, pior, sem sistema de segurança, nem mesmo uma câmera com sensor de movimento.

E o que dizer de Paris Hilton deixar a chave da casa sob o capacho da entrada? Acredito que nem alguém cuja residência seja bem mais modesta, sem tantos objetos valiosos, seria tão idiota a ponto de confiar tanto na boa índole alheia. E não apenas isso. Qualquer um com um pouco de bom senso, depois de ter sua casa invadida duas ou três vezes, além de não deixar mais a chave no local de costume, certamente instalaria um sistema de segurança ou contrataria vigilantes. Não que Paris Hilton seja um exemplo de alguém de bom senso, mas mesmo assim. A situação toda que propiciou os arrombamentos parece bastante irreal quando analisada racionalmente.

Mas não há nada de racional numa cidade em que pessoas deixam carros destrancados na rua com carteiras cheias de dinheiro dentro; ou em que famílias saiam em viagem sem verificar se todas as portas e janelas da casa estão trancadas; ou em que adolescentes de famílias ricas achem moralmente aceitável abrir esses mesmos carros e arrombar essas mesmas casas para se apossar de algo que não lhes pertence, apenas por pertencerem a alguém famoso que elas admiram e, logicamente, invejam; e, em que, cometido o delito, ainda se vangloriem e se exibam pelas redes sociais sem qualquer remorso. E o roteiro consegue mostrar essa distorção na visão de mundo desses adolescentes e a corrosão da moral que ao menos a maioria de nós acredita ser inerente ao ser humano.

Os diálogos parecem artificiais. Mas basta assistir ao reality show que Alexis Neiers (no filme, Nicki, Emma Watson) apresenta - Pretty Wild, no canal E! - para perceber que aquele jeito artificial e grandiloquente é característico do modo de falar desse grupo de jovens. Neiers foi a principal “consultora” a respeito dos eventos, mesmo não sendo a chefe da gangue. Ganhou notoriedade por ser menos reservada que os demais ao comentar o assunto. E Emma Watson representa-a muito bem. O ar de mocinha de boa família que foi influenciada pelas más companhias fica bastante evidenciado em suas entrevistas à imprensa.

Enquanto as garotas não parecem sentir qualquer tipo de remorso, Nick Prugo (no filme, Marc, Israel Broussard) é o único que demonstra certo peso na consciência pelo atos cometidos. É interessante seu diálogo com a repórter em que se diz assustado com o fato de as pessoas valorizarem mais os atos de vandalismo cometidos por eles - inúmeros desconhecidos pedem para adicioná-lo no Facebook - do que valorizariam alguma atitude humanitária. Se tivessem feito algo bom e generoso, a notoriedade não seria tamanha. Essa atração do público pelo estereótipo de Bonnie & Clyde é doentia. Broussard, apesar de mais bem-apessoado que Prugo, convence bem como o rapaz deslocado que topa acompanhar Rachel Lee (no filme, Rebecca, Katie Chang) e as outras garotas apenas para ser aceito como parte de um grupo.

O roteiro não tem como ser muito criativo, já que se baseia em fatos reais. O que se vê então é uma sucessão de invasões, o deslumbramento com as posses dos famosos, fotos tiradas no meio de ambientes luxuosos, festas, drogas, bebidas, exibicionismo. Como retrato de um grupo sem restrições morais se divertido à custa dos bens alheios, o filme funciona muito bem. E apenas isso.



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Golden Four Asics: Custo x benefício

coded by ctellier | tags: | Posted On quinta-feira, 1 de agosto de 2013 at 18:54

meteorologia: sol e céu azul
pecado da gula: omelete de queijo e bacon
teor alcoolico: nada ainda
audio: the doors
video: la piel que habito

Apesar de ter feito inscrição em duas das três edições da Golden Four, esta, de 2013, foi a primeira que corri. Em 2011, sequer me inscrevi pois estaria em um evento no dia da prova. Em 2012, fiz a inscrição, busquei o kit, mas amanheceu chovendo no dia da prova e, lógico (pra quem me conhece), eu não fui.

Esta não foi minha primeira meia maratona, já perdi a conta de quantas já fiz. Porém, a usei como prova-alvo no intuito de ter um objetivo a perseguir e conseguir recuperar a motivação perdida - a propósito, deu certo. Ter uma planilha a seguir, focando determinada prova, sempre funciona para mim. Ela, a planilha, foi seguida quase à risca. A meta seria completar em 1h50m. Contudo, tendo em vista que meu melhor tempo em meias ainda era acima de duas horas - 2h01m, se não me engano - baixar desse tempo já me deixaria satisfeita. Tinha consciência que baixar 11 minutos seria difícil. Criei um blog e uma página no facebook para postar os treinos diários - mais uma maneira de evitar que eu matasse muitos treinos, pois assumir um compromisso público gera uma certa vergonha de admitir não ter treinado por pura preguiça. Não atingi a meta, mas nem por isso deixei de curtir a prova. Uma dor na coxa me perseguiu nos últimos 5km, me obrigando a alternar corrida e caminhada até o final, fechando em 2h06m.

Mas o que me levou a escrever o post não foi o impulso de compartilhar minha frustração por não ter atingido minha meta. O motivo foi outro. Já há alguns meses - 3 para ser mais exata - que não participava de provas. E, diferente dos anos anteriores, corri apenas 4 provas este ano até agora. E a causa principal não é a falta de ânimo ou motivação, mas sim o valor alto das inscrições. Há dois anos que optei por me inscrever e correr apenas em provas de 15km ou mais - com raras exceções - simplesmente por me recusar a pagar entre 80 e 120 reais para correr a distância que eu comumente faço nos meus treinos quase diários, que variam de 8 a 12 km. Com o agravante de que, muitas vezes, além de alto o valor pago não é devidamente revertido em benefícios para os corredores.

Com relação a isso, a Golden Four fez valer o dinheiro gasto na inscrição. Senti-me totalmente satisfeita com o que foi “entregue” pela organização:

  • Antes da prova

  • O evento no dia da entrega do kit , ou expo como alguns chamam, foi bem interessante. Várias palestras com assuntos relativos ao esporte, com repórteres, atletas, entre outros. Kit bem montado: chip, número de peito, camiseta, viseira - tudo dentro de um gym sack estiloso, com dois bolsos internos. Além do kit, os participantes ainda recebiam um lanche - sanduíche, fruta e suco - e, quem tivesse paciência de encarar fila, poderia colocar seu nome na camiseta.

  • Durante a prova:

  • A largada atrasou um pouco, 7 minutos, mas isso não é nada perto de outras provas em que o atraso ultrapassou 20 minutos. O mais correto é cumprir o horário, mas enfim, dos males, o menor. Todos os postos de hidratação, a cada 3 km mais ou menos, distribuíam água e gatorade - e não faltou nem um nem outro. Havia pacers para ajudar os corredores que pretendiam fechar a prova em determinado tempo - eu, por exemplo. Contudo, apenas os vi no final da prova. Os marcadores para término em 2h passaram por mim no quilômetro 19. Não fosse a dor na coxa, eu os teria acompanhado até o fim.

  • Após a prova:

  • Teve lanche, massagem, fotos, enfim, mimos para quem madrugou em pleno domingo para correr 21km num frio de 10°. E não só isso, voltei para casa, e já havia um SMS informando meu tempo na prova. Ou seja, tratamento vip do início ao fim.

    Não faço a menor ideia de como é calculado o valor da inscrição, mas se as corridas populares do SESC e SESI custam de R$ 20,00 a R$ 30,00 e conseguem ser tão bem organizadas quanto essas provas “de grife”, fico me perguntando por que eu deveria desembolsar R$ 100,00 para participar de provas que, por vezes, são piores. Algumas da Yescom perdem feio nesse quesito, por exemplo. Eu, particularmente, não faço questão das “frescuras” que têm feito parte tanto do kit quanto da prova em si. Fico plenamente satisfeita se receber chip, número de peito, camiseta e hidratação adequada durante o percurso. Sei que muita gente curte - se não houvesse tantos adeptos, as empresas organizadoras não investiriam tanto nisso. E já que há os que não fazem questão e os que gostam bastante, acredito que deveria se tornar padrão a disponibilização de várias opções de kits, do básico ao mais caprichado. Algumas provas já têm isso - fiz inscrição na Etapa III do Circuito Athenas e pude optar pelo kit simples - o que talvez me faça voltar a participar com mais frequência.

    Independente disso tudo, eu continuo correndo. E que venha a próxima prova :-)

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    "I'm not as stupid as you think I am."

    coded by ctellier | tags: | Posted On sábado, 27 de julho de 2013 at 17:15

    meteorologia:
    pecado da gula:
    teor alcoolico:
    audio:
    video:

    (resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 20/07/2013)

    Flawless (1999) - Ninguém é perfeito
    roteiro e direção: Joel Schumacher
    ★ ★ ★ ★ ★

    Um ex-policial ultraconservador, Walt Koontz (Robert De Niro), sofre um AVC enquanto tenta socorrer um vizinho. Com metade do corpo semi-paralisada, torna-se um recluso. Por indicação de sua médica, a fim de melhorar suas condições de fala, começa a ter aulas de canto com o vizinho do andar de cima, Rusty (Philip Seymour Hoffman) que, por acaso, é uma drag queen.

    Walt Koontz:
    I'm not as stupid as you think I am.

    Rusty Zimmerman:
    Honey, you could never be as stupid as I think you are.

    A estrutura “dois personagens opostos que não se dão bem, vêem-se obrigados a conviver devido a alguma circunstância (aparentemente) imprevista e passam a enxergar o oposto com outros olhos” é bastante manjada, mas ainda funciona muito bem em estórias em que os personagens, e seu desenvolvimento, são o foco. Referente à forma como cada um encara o outro, é interessante reparar, logo no início do filme, quando Koontz discute com Rusty através do vão central do prédio, o ex-policial grita de dentro do apartamento e vê Rusty distorcido pelo vidro da janela. Se o espectador tem alguma dúvida sobre o preconceito de Koontz, essa cena mata qualquer incerteza.

    Há algumas cenas externas, contudo a maior parte do filme passa-se dentro do prédio sujo e decadente. Os apartamentos minúsculos atulhados de memórias (Koontz) e de sonhos (Rusty) - acentuam a solidão de cada um deles. O espectador consegue sentir a claustrofobia do ambiente, mas Schumacher poderia não ter exagerado tanto nos ângulos holandeses e nos closes para obter esse efeito.

    O filme poderia facilmente pender para o dramalhão, já que os diálogos são pouco inspirados e muitas vezes suscitarem aquela impressão de “Hmmm, acho que já ouvi isso em outro filme.” O que salva a trama desse destino são algumas tiradas cômicas - e bastante sarcásticas - que arrancam risos do espectador ao mesmo tempo que o deixam ligeiramente desconfortável por compartilhar da visão preconceituosa de um ou de outro.

    Apesar de Schumacher não constar da minha lista de diretores/roteiristas prediletos (longe disso), há que se reconhecer um mérito dele neste filme: conseguiu não interferir na performance dos atores. Sim, pois mesmo considerando-se que os personagens - Koontz e Rusty - serem um tanto caricatos, De Niro e Hoffman têm atuações primorosas. Atuações que per se carregam o filme nas costas, já que o desenrolar da estória é bem previsível para qualquer um que já tenha assistido a muitos filmes. Ambos estão muito bem, mas Hoffman realmente se destaca como Rusty. Percebe-se isso nitidamente numa cena mais sóbria em que, mesmo vestindo um terno, ele ainda é uma drag queen. E ele obtém isso ‘apesar’ do exagero do punho desmunhecado e dos trejeitos clichês, está tudo em sua maneira pausada de falar e na entonação de sua voz.

    É um daqueles filmes em que as atuações compensam o roteiro mediano e pouco envolvente.



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    Après Mai

    coded by ctellier | tags: | Posted On sexta-feira, 26 de julho de 2013 at 15:31

    meteorologia: frio, frio, muito frio
    pecado da gula: cocada
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: moulin rouge
    video: orange is the new black

    (resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 19/07/2013)

    Après Mai (2012) - Depois de Maio
    roteiro e direção: Olivier Assayas
    ★ ★ ★ ★ ★

    Retratando a efervecência política do início dos anos 70, o filme acompanha Gilles (Clément Métayer), estudante do ensino médio, e seus colegas de escola - Christine (Lola Créton), Alain (Felix Armand) e Jean-Pierre (Hugo Conzelmann) - que militam num grupo que defende ideias revolucionárias. Depois que uma “ação” dá errado, com desdobramentos imprevistos, os amigos se vêem forçados a sair dos arredores de Paris.

    Gilles, apesar de engajado politicamente, está mais interessado em adquirir conhecimento para levar adiante sua arte - sua intenção é fazer cinema. E essa sua escolha causa discussões acaloradas com os amigos, que respiram política e não entendem como ele pode privilegiar a arte em detrimento da luta pela mudança da situação do país em que vive. E é interessante ver como ele defende seu ponto de vista, afirmando que a arte, a expressão artística deve acompanhar e dar vazão a essas ideias. Um dos diálogos que mais me agradou foi entre Gilles e Christine em que discutem sobre um filme de ideais revolucionários a que acabaram de assistir. Enquanto ele questiona que se a temática é revolucionária, a linguagem cinematográfica utilizada também deveria ser revolucionária; ela, já absorvendo o posicionamento dos autores do filme visto, afirma que o intuito é atingir as massas, e manter a linguagem “tradicional” é a única maneira de fazer essas ideias serem compreendidas. Fazer algo experimental não obteria o mesmo resultado.

    Christine:
    Ils ont des convictions, ils vont jusqu’au bout.
    Et toi? tu fais mieux qu’eux?

    Os personagens são rasos, e a atuação superficial do elenco também não colabora. Entendo que a maior parte do elenco é de não-atores, salvo por Lola Créton. Mas isso não é desculpa (vide Cidade de Deus). Exceto por algumas cenas, em que os atores parecem genuinamente envolvidos e imersos nos personagens e na trama, a maior parte do tempo tem-se a impressão de que todos estão entediados, posando para a câmera enquanto recitam seus diálogos.

    Três elementos se destacam positivamente. A trilha sonora, simplesmente deliciosa de ouvir, composta em sua maioria de músicas menos conhecidas da época. Merece ser desfrutada independentemente do filme. A direção de arte, responsável por uma reconstrução de época bastante eficiente, com cenários e figurinos que remetem diretamente ao período retratado. E a fotografia de tirar do fôlego de Eric Gautier (On the road e Into the wild). Praticamente todos os fotogramas do filme merecem ser emoldurados e exibidos como obras de arte. Se o elenco não fez sua parte, conquistando o público, a fotografia compensou - e muito - fazendo o espectador mergulhar naqueles enquadramentos.

    O filme não tem uma estória fechada, com começo, meio e fim. A trama é bem solta e não há as estruturas características da maioria dos filmes - pontos de virada, arcos dramáticos, etc. O espectador vai acompanhando cada um dos personagens em sua jornada de descobrimento e passagem para a vida adulta. O rumo que cada um deles toma, suas escolhas, suas amizades, seus interesses, seus amores. O diretor optou por não dar um fechamento ao arco dos personagens, já que a vida deles continua, não termina ali. Enfim, o filme acaba, mas a estória não.




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    Man of steel

    coded by ctellier | tags: , | Posted On sábado, 20 de julho de 2013 at 14:29

    meteorologia: sol e céu azul
    pecado da gula: pão com ovo frito
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: guilherme arantes
    video: copper

    (resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 12/07/2013)

    Man of steel (2013) - O homem de aço
    roteiro: David S. Goyer
    direção: Zack Snyder
    ★ ★ ★ ★ ★

    É fato que todos conhecem a estória do Superman, nem que seja apenas em linhas gerais. Bebê chega à Terra sozinho numa espaçonave oriunda de Krypton. Criado pelo casal Kent, Clark cresce tendo que aprender a lidar com suas habilidades sobre-humanas.

    Apesar de ser mais um filme da franquia Superman, este não é uma continuação dos demais, mas sim, um filme de origem. E, sendo assim, é em torno do início da estória de Clark que gira a trama do filme. Claramente superior ao Superman de Bryan Singer (de 2006) - morno demais, entediante demais - , este investe suas fichas num personagem mais realista, mais sombrio e, contrariando o senso comum, mais alienígena que todos os anteriores. E por conta disso, pode-se arriscar dizer que este não é um filme de Superman, de um homem com superpoderes, mas sim de um herói - ou um deus - em construção.

    O prólogo, interessante mas excessivamente longo no meu entender, nos mostra o conflito que causou a destruição de Krypton e que levou Jor-El (Russell Crowe), um cientista do alto-escalão, a enviar seu filho recém-nascido, Kal-El - que virá a ser Clark Kent (Henry Cavill) - numa espaçonave à Terra. Não conheço os quadrinhos - aliás, o personagem em si não me agrada muito - e, portanto não faço a menor ideia de como “deveria” ser retratado o planeta. Mas a direção de arte acertou ao optar por um aspecto biomecânico, lembrando um pouco os desenhos de H.R.Giger utilizados em Alien.

    E, desde o início, já começam a aparecer os típicos buracos de roteiro, quase inevitáveis nesses filmes de super-heróis. Se, conforme é esclarecido tanto por Jor-El como pelo General Zod (Michael Shannon), todos os kriptonianos já nascem com papéis pré-definidos, o espectador um pouco mais observador certamente se pergunta como Jor-El, predestinado a ser um cientista, luta tão bem quanto (ou quase melhor que) Zod, um soldado nato. Isso e mais a cena “ironman style” em que Jor-El veste sua armadura, diminuem o impacto da sequência do confronto entre eles, enfraquecendo a imersão na trama. Mas ainda assim, esse primeiro terço do filme consegue prender o público o suficiente para querer assistir ao desenrolar da estória.

    A opção de retratar a infância e adolescência de Clark através de flashbacks, ao invés de seguir uma narrativa linear, deu certa leveza e dinamismo à estória. Desse modo, o espectador vai, aos poucos, sendo apresentado ao personagem, conhecendo seu passado, seu convívio com os pais adotivos - Martha (Diane Lane) e Jonathan Kent (Kevin Costner), o modo como descobriu a aprendeu a controlar seus poderes. Algumas sequências poderiam ser mais curtas, mas não chegam a comprometer o ritmo. Porém há um especialmente que me irritou, não pela duração mas pelo excesso de dramalhão, e me fez soltar um “PQP! q idiotice!”. Evitando spoilers, é uma cena que envolve um furacão, uma estrada, vários carros, um cão e o pai de Clark - quem assistiu sabe a que me refiro. E em todos esses flashbacks enfatiza-se insistentemente a vocação escoteira do protagonista, que chega a ser chato de tão bom-moço.

    Aproveitando a deixa, vale ressaltar que a tentativa de reafirmar o personagem como sendo o “homem que veio do céu para salvar a humanidade” é forçada e fora de contexto. O tom messiânico incomoda bastante em vários momentos. O discurso de Jor-El sobre o destino do filho, afirmando que seu papel é ser um “guia” para os humanos atingirem a paz e a felicidade eternas - algo como um nirvana - soa piegas e até meio ingênuo. Como se já não bastasse Clark falar, sem mais nem menos, que tem 33 anos, a cena em que ele aparece numa igreja conversando com um padre, que surgiu do nada na estória, é patética, além de totalmente desconectada da estória. Poderia ser cortada sem prejuízo algum, evitando inclusive que o espectador, mais uma vez, “saia” do filme e se pergunte: “Pra que isso?”.

    Lógico que nem só de cenas intimistas e familiares é feito o filme. O que todo fã espera são as sequências de ação, que são inegavelmente muito boas. O problema é que, devido à escala megalomaníaca (justificável), as cenas lembram demais The Avengers - principalmente aquela em que Superman e Zod se confrontam em Metrópolis. E, assim como o prólogo, esta sequência acaba sendo cansativa pela duração muito extensa e pela falta de estretégia de Zod que, afinal, é um militar. E não apenas isso, tem-se a impressão de que toda a ação, a luta, a destruição está concentrada demais nesse momento da estória, quase saturando o espectador que, talvez chegue a pedir, em pensamento: “Finaliza logo o vilão, p%$#@!”.

    Interessante reparar que, apesar de não haver semelhança física, em alguns momentos Cavill lembra um pouco “O” Superman, Christopher Reeve. Convenhamos, não é muito difícil ser mais expressivo que Brandon Routh, e Cavill consegue dar ao personagem tanto a insegurança de quem ainda não tem certeza do rumo a tomar quanto o carisma do herói que vai “salvar o dia”. Não é atuação digna de prêmio, e a quase bidimensionalidade do personagem não dá margem a isso, mas é convincente na medida certa. Costner e Lane estão ok como os pais adotivos de Clark. Amy Adams consegue tirar de Lois Lane aquele ar de mocinha indefesa em perigo. Mas quem se destaca é Shannon, construindo um vilão a seu modo incorruptível e ao mesmo tempo bastante ameaçador.

    É natural que um reboot da franquia gere estranheza e divida opiniões. Se não agrada a gregos e troianos, é algo inerente a filmes desse gênero já que é difícil encontrar o ponto de equilíbrio entre tornar a estória palatável aos “leigos” e agradar aos fãs de carteirinha. E, apesar de alguns defeitos, é um filme que cumpre sua função de entreter.






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    Drops » The fall

    coded by ctellier | tags: , | Posted On segunda-feira, 17 de junho de 2013 at 08:58

    meteorologia: friozinho
    pecado da gula: frango frito
    teor alcoolico: uma bernard amber
    audio: beethoven
    video: friends

    The fall (2012)
    ★ ★ ★ ★ ★

    Órfã de séries. Fringe acabou. Game of thrones e The Walking Dead só voltam em 2014. Bones, meu vício, também. Homeland, só em setembro. Sherlock, se tudo der certo, no final do ano. The following se revelou uma fraude. Hannibal é boa, mas não preenche o vazio deixados pelas minhas séries prediletas. Fuçando no Netflix, ocasionalmente, encontro algo interessante, tipo Whitechapel. E, dia desses, achei The fall, com Gillian Anderson, a eterna Dana Scully (que também aparece em Hannibal).

    A série, produzida inicialmente com cinco episódio, mas já renovada para uma segunda temporada, acompanha Stella Gibson (Gillian Anderson), uma investigadora da polícia britânica chamada a Belfast para revisar o caso do assassinato de uma mulher, ligada a um figurão da cidade. Durante a revisão, percebe que não é único mas parte de uma série. Em paralelo, acompanhamos Paul Spector (James Dornan, o xerife de Once upon a time), psicólogo, casado, pai de um casal de filhos, que vigia, persegue e ataca mulheres.

    E é o jogo de gato e rato entre os dois que leva a trama adiante. Ao contrário da maioria das séries policiais procedurais em que o casal central são parceiros nas investigações, nesta são antagonistas. E é interessante notar que aquilo que Spector odeia nas mulheres que mata é o que caracteriza Gibson: o sucesso profissional, a independência, o poder de decisão sobre a própria vida. Uma fala de Gibson, no terceiro episódio, exemplifica bem o modo como ela encara o “ser mulher” e o modo como ela sabe que é vista:

    “That’s what really bothers you, isn’t it? The one night stand? Man fucks woman, subject man, verb fucks, object woman. That’s okay. Woman fucks man, women subject, man object. That’s not so comfortable for you is it?”




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    "May I come in?"

    coded by ctellier | tags: , | Posted On sábado, 15 de junho de 2013 at 09:02

    meteorologia: solzinho e vento frio
    pecado da gula: pizza amanhecida
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: máquina do mempo fusion #004
    video: the fall

    Låt den rätte komma in (Let the Right One In) (2008) - Deixa ela entrar
    roteiro: John Ajvide Lindqvist
    direção: Tomas Alfredson
    ★ ★ ★ ★ ★

    Let me in (2011) - Deixe-me entrar
    roteiro: Matt Reeves, John Ajvide Lindqvist
    direção: Matt Reeves
    ★ ★ ★ ★ ★

    Antes de mais nada, gostaria de deixar claro que este post tem mais impressões de espectadora (e leitora) e menos observações técnicas sobre o filme.

    Sei - e já afirmei isso em outros textos - que um filme baseado em livro deve bastar-se como obra e que, justamente por serem mídias diferentes, não se deve esperar que o filme seja ipsis literis o livro. É inevitável que ocorram perdas e que sejam feitas alterações na transcrição. Este post não é uma comparação livro versus filme, mas filme versus remake, analisando não qual deles é uma adaptacão mais fiel do livro e sim qual conseguiu manter a essência dele, o que a meu haver é o mais importante.

    Fui assistir aos dois filmes motivada pelo término da leitura do livro (resenha aqui). Assisti à versão sueca, de 2008, depois ao remake norte-americano (lógico), de 2011. E, posso afirmar, apesar de serem bem semelhantes, o clima do livro está presente apenas no segundo.

    O livro é um thriller de terror dos mais eficientes, daqueles de roer as unhas e se encolher na poltrona. Sua narrativa é brutal, crua, chocante até em alguns momentos. E, em várias cenas - por já saber da existência dos filmes - parava a leitura e ficava pensando: “Powtz! Vai ser legal demais ver esta cena no filme!”. Em muitos momentos, a leitura desperta sensações de asco, estranhamento e, lógico, susto. E, na versão sueca, não há praticamente nada disso. O filme não é ruim, mas é morno, lento, quase sonolento. Enquanto que o remake, ainda que tenha mais ou menos o mesmo ritmo, consegue ter cenas mais impactantes e criar muito mais tensão.

    trecho do livro
    “Virginia consegiu ficar de pé de novo, rodopiou e tentou se livrar daquilo que estava em suas costas.
    Era algo que mastigava seu pescoço e sua gargata, e o sangue que jorrou foi lhe descendo por entre os seios. Ela berrou tentando arrancar o animal das costas, e continuou gritando enquanto caía de novo na neve.
    Até que alguma coisa dura tocou a boca de Virginia. A mão de alguém.
    Na bochecha, garras que se enterraram na carne macia... e que continuaram, até atingirem o osso da face.”
    (p.238)

    Apesar de em várias cenas, a versão sueca ser mais fiel ao livro, o remake aproveita as cenas para evidenciar alguma característica do personagem. Como quando Eli (Abby) ataca Virginia, por exemplo (acima). A violência do ataque e a força de Eli (Abby) segurando a vítima, detalhes bem evidenciados em outros pontos do livro, e que julgo essenciais para entender a essência do personagem, são atenuados na versão sueca. Sim, no livro, Lacke (Larry) afasta Eli (Abby) com apenas um chute. Mas o que não se sabe é o que ocorre antes disso (descrito em detalhes no livro) e que o remake utiliza para dar força à cena.

    Não quer dizer que a estória não tenha elementos eternecedores e tocantes por sua sensibilidade. O relacionamento entre Oskar (Owen) e Eli (Abby) evoluiu calmamente e com sutileza ímpar. E isso está presente em ambos os filmes. Apesar de Chloë Grace Moretz conseguir dar a Abby um ar mais ingênuo e infantil que reflete com mais acuidade a psique da personagem, Lina Leandersson também constrói Eli de forma bastante adequada.

    Não me incomodou em nada a supressão das estórias paralelas e de vários outros núcleos de personagens. Senti falta mesmo da trama envolvendo a transformação de Håkan (O Pai) em vampiro. Mas entendo que nem essa nem as demais caberiam no filme. Contudo, algumas cenas que foram deixadas na versão sueca parecem soltas, deslocadas do contexto, com pouca ou nenhuma razão de existir. No remake, mesmo com várias alterações que não chegam a modificar o rumo da trama - algumas aliás foram ótimas soluções na adaptação para a tela - não há cena desnecessária ou sem explicação. No original, há várias em que um personagem, do nada, resolve fazer algo (que está no livro) mas que no filme não faz sentido, já que não há nada que justifique aquela ação. Dá a impressão que os roteiristas do remake perceberão isso e suprimiram o que não era imprescindível. E, com ligeiras modificações, conseguiram amarram todas as pontas.

    Enfim, os filmes são bons, bem produzidos, mas a versão original me decepcionou por não conseguir trazer para a tela a crueza do texto de Lindqvist, perdendo muito do seu impacto.



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    The angel’s share

    coded by ctellier | tags: | Posted On quinta-feira, 13 de junho de 2013 at 10:03

    meteorologia: cadê o verão?
    pecado da gula: brigadeiro
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: queen
    video: band of brothers

    (resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 06/06/2013)

    The angel’s share (2012) - A parte dos anjos
    roteiro: Paul Laverty
    direção: Ken Loach
    ★ ★ ★ ★ ★

    Robbie (Paul Brannigan), um jovem desempregado prestes a ser pai, é sentenciado a cumprir algumas horas de trabalho comunitário depois de espancar um rapaz na rua por um motivo banal. No grupo de infratores que cumprem pena ao mesmo tempo que Robbie, ele encontra outras pessoas com o mesmo problema dele - ter vivido sempre à margem da sociedade e ter dificuldade em arrumar emprego. Robbie encontra também, na figura do supervisor do serviço comunitário, um amigo e um mentor no conhecimento de algo até então ignorado por ele - a degustação e apreciação de uísque. E Robbie entrevê, nessa nova atividade, uma possibilidade de mudar de vida, de começar uma nova vida com a namorada, Leonie (Siobhan Reilly), e o filho recém-nascido.

    Para os abstêmios ou não apreciadores de destilados, vale uma explicação sobre o título. A ‘parte dos anjos’ refere-se àquele percentual de uísque que evapora dos barris de carvalho durante o envelhecimento. Lógico, tem a ver com a bebida “descoberta” pelos personagens, porém tem mais a ver com algo que ocorre na segunda metade do filme, mas que me abstenho de contar para não tirar a graça da estória.

    É um filme singelo que talvez fosse lembrado como apenas mais um filme escocês sobre as dificuldades do ingresso na vida adulta não fosse pela guinada no roteiro que ocorre a partir da segunda metade da trama. O filme deixa de ser uma estória dolorosa sobre problemas sociais e jovens infratores para se tornar uma aventura no melhor estilo ‘sessão da tarde’, em que ideias mirabolantes são postas em prática e conseguem ser bem-sucedidas a não ser por um percalço ou outro. Esse novo rumo surpreende o espectador e é nele que reside a leveza do filme, apesar de todo o non-sense das situações vividas pelos personagens. A mudança de tom e a nova abordagem da estória fazem toda a diferença no resultado final.

    A trajetória de Robbie remete ao herói injustiçado que recebe um dom, que será responsável pela rendenção do personagem. Robbie consegue, usando sua aptidão recém descoberta, vislumbrar a possibilidade de sair da vida marginal e imersa em violência em que se encontrava até o momento. E, contrariando a máxima de que o ambiente molda o caráter, decide tomar as rédeas da sua vida nas próprias mãos. E, mesmo tomando um atalho a princípio - que leva o espectador a questionar se os fins justificam os meios-, livra-se do passado e dá um novo rumo à sua vida junto à sua nova família.

    O filme não é longo, e assim consegue manter o ritmo do início ao fim, sem “barrigas”. Os diálogos ágeis e ácidos ganham o espectador principalmente nas cenas em que o grupo se inicia na degustação - que apreciador já não passou por isso? ser ridicularizado ao afirmar que um vinho, cerveja, uísque tem determinado aroma ou sabor - e durante a excursão a uma destilaria, em que o uso dos kilts causa consequências desagradáveis. O elenco central, praticamente desconhecido, tem boa empatia e convence como ‘gauches’ na vida que tentam de alguma forma dar certo.

    É um filme despretensioso cujo sucesso reside na ambiguidade entre drama e comédia e que se torna bem sucedido justamente por não tentar misturar os dois gêneros e ainda assim conseguir manter o estilo do diretor e não deixar de lado a crítica social.



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    Carnage

    coded by ctellier | tags: | Posted On quarta-feira, 5 de junho de 2013 at 08:56

    meteorologia: frioooo...
    pecado da gula: pão de queijo
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: depeche mode
    video: whitechapel

    Carnage (2011) - Deus da carnificina
    roteiro: Yasmina Reza
    direção: Roman Polanski
    ★ ★ ★ ★

    (resenha publicada originalmente no Vórtex Cultural, em 29/05/2013)

    Dois casais, Penelope e Michael Longstreet (Jodie Foster e John C. Reilly) e Nancy e Alan Cowan (Kate Winslet e Christoph Waltz) encontram-se no apartamento dos Longstreet para conversar a respeito de uma briga em que os respectivos filhos se envolveram. E o encontro, comprovando o princípio entrópico, avança e degenera rumo ao caos, transformando-se na carnificina do título.

    A exemplo de Who's Afraid of Virginia Woolf?, o filme é adaptado de uma peça de teatro em que dois casais estão confinados num único ambiente - casa ou apartamento. Contudo, diferente deste, em que os recém-casados Nick e Honey (George Segal e Sandy Dennis) presenciam a lavação de roupa suja do casal “mais veterano”, Martha e George (Elizabeth Taylor e Richard Burton); em Deus da carnificina, os casais parecem ter mais ou menos o mesmo tempo de vida em comum e as batalhas verbais ocorrem entre todos. Mas mesmo assim, é difícil não traçar um paralelo, já que em ambos os casais usam o conhecimento advindo da intimidade para que suas palavras causem o maior dano possível. A ironia, o sarcasmo, a acidez de algumas falas revelam que cada um conhece o ponto fraco do outro e mira ali propositalmente. Contudo, o diferencial do filme de Polanski é que as discussões vão além do relacionamento entre os casais - por exemplo, o capitalismo despudorado de Alan versus o idealismo esquerdista de Penelope.

    O fato de ser uma adaptação de uma peça poderia se tornar um complicômetro. Porém, o diretor soube usar a técnica cinematográfica a seu favor, fazendo algo que no teatro não seria possível e assim direciona o olhar do espectador a seu bel-prazer. Os atores surgem em planos e contraplanos, aos pares, trio, quarteto, acompanhando, como num passo de dança, a intensidade dos diálogos. E, assim como Lumet em 12 angry men (também baseado numa peça), Polanski usa a câmera para controlar o ponto de vista do público e intensificar sua reação ao que acontece em cena. É interessante notar que o confinamento dos casais nesse ambiente deve-se totalmente ao acaso - o café oferecido na hora de ir embora, o sinal do celular que falha a caminho do elevador, entre outros pequenos eventos que fazem o casal Cowan sempre voltar ao interior do apartamento.

    E já que o desfecho não é inesperado, sabe-se desde o trailer para onde se encaminha a trama, o interessante é acompanhar como isso acontece. Ver a evolução dos personagens. A civilidade e as convenções sociais sendo deixadas de lado. A polidez dando lugar à sinceridade extrema. As máscaras caindo à medida que os ataques verbais se sucedem. Situações triviais deflagrando reações desmedidades e aparentemente irracionais. A conversa, que se inicia de forma trivial, evolui de tal forma que deixa o ambiente tenso. Comentários normalmente inofensivos tornam-se o estopim para uma saraivada de reclamações e observações sarcásticas. E as protagonistas das discussões vão se alternando - casal versus casal ou um contra um em todas as combinações possíveis.

    A tensão que se instaura desde o início gera até uma reação física em Nancy. É estranho lembrar-se de um filme e referenciar-se a ele por causa de uma cena de vômito. Mas a cena foi tão bem feita e encenada, tão verossímil - tem-se a impressão de sentir aquele odor acre característico - que fica difícil não citá-la. Principalmente por que é a partir daí que a situação degringola. Se o espectador fica ao mesmo tempo surpreso e chocado com a cena, o mesmo ocorre com os personagens. O vômito parece servir de gatilho para os bons modos serem abandonados enquanto todos se sentem no direito de, a partir desse momento, expressar livremente seus pensamentos.

    Kate Winslet está perfeita nesta cena. Mas não apenas nesta, destaque também para o declínio do seu grau de sobriedade após alguns goles de um ótimo scotch. Aliás, todo o elenco está acima da média. Mesmo não tendo mais nada a provar, há tempos não se via Jodie Foster tão bem num papel. Numa obra em que a trama é calcada em personagens e diálogos, a excelência das atuações é algo essencial e que garante a fluidez da narrativa. O espectador consegue acompanhar, em closes e planos-detalhe, os gestos, maneirismos, micro-expressões de cada um dos atores, nuances dos personagens que seriam impossíveis de observar num teatro.

    Não é o melhor filme de Polanski. Mas mesmo um filme menor do diretor consegue conceder ao espectador uma experiência cinematográfica gratificante, mesmo que incômoda. Afinal, enxergar-se nas atitudes dos personagens não é nada agradável.



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    Drops » Whitechapel

    coded by ctellier | tags: , , , | Posted On terça-feira, 4 de junho de 2013 at 13:42

    meteorologia: ensolarado, mas frio :-(
    pecado da gula: queijo quente, com muuuuito queijo
    teor alcoolico: nada ainda
    audio: queen
    video: friends

    Whitechapel (2010)
    ★ ★ ★ ★ ★

    Série britânica com apenas três episódios por temporada. Seguindo a máxima "menos é mais", as séries britânicas costumam ser bem produzidas e ter bons roteiros. E esta não decepcionou. Assisti em dois dias às duas temporadas disponíveis no Netflix.

    A premissa é bem interessante: um copy-cat de Jack, o Estripador começa a agir na cidade, ao mesmo tempo em que um “almofadinha” carreirista e portador de TOC assume a inspetoria responsável pela investigação do caso. Este é o mote da primeira temporada.

    Na segunda, o alvo da imitação são gângsters, os irmãos Kray. Talvez por não serem conhecidos fora da Inglaterra - eu, ao menos, nunca tinha ouvido falar deles - a temporada não tenha sido tão interessante no quesito investigativo. Mas o desenvolvimento dos personagens compensou bastante.

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